quarta-feira, outubro 10, 2001

volto a pé, e mergulho na noite da cidade, acompanhado por um cortejo de sombras minhas, por um balé de sósias escuros que giram em torno dos meus pés e deslizam mudos pelos muros, pelas grades, pelo asfalto fosco, asfalto que absorve feito esponja as nossas cores que os jorros de luz de cada lâmpada colorida, de cada farol veloz lavam e fazem escorrer asfalto adentro. Outros tantos homens cruzam meu caminho, já desbotados de tantas luzes, indistintos como a soma total dos pedaços de conversas, como as carícias duras dos motores, buzinas e freios.

em pouco tempo estarei em casa, e uma ducha de água morna há de me recobrar as cores e o brilho, e arrastar ralo adentro, canos e entranhas da cidade adentro, todos os vestígios oleosos que o dia deixou sobre mim.

algo, porém, a água não leva, não lava. o brilho fugidio daquele sorriso tingiu minha pele, ficou tatuado no peito, e há de me iluminar e aquecer por um bom tempo.
(ouça aqui a versão falada)